A ideia de que o vazamento de petróleo da Chevron pode fazer o Brasil adotar regras mais rigorosas para a exploração e produção (E&P) de petróleo em águas profundas não passa de fantasia.
Um acidente quase nunca serve como toque de despertar nem quando se torna desastre, e até as maiores catástrofes terminam esquecidas.
Obama não abandonou a ideia de abrir vastas áreas da plataforma continental americana à E&P de petróleo e gás natural, anunciada semanas antes do desastroso vazamento da BP, no golfo do México, em 2010. Por quê? A necessidade de independência energética, especialmente ante o petróleo proveniente do instável Oriente Médio, é grande demais nos EUA.
Um Brasil autossuficiente em petróleo esquecerá esse vazamento muito menor da Chevron por motivo diferente: o pré-sal. As reservas podem em dez anos fazer do Brasil um grande e rico exportador de petróleo. E esses potenciais petrodólares não permitirão que o país reconsidere os riscos de exploração dos campos do pré-sal, que ficam a profundidade seis vezes maior que a da área que a Chevron explorava.
Será que importa que as gigantescas pressões dos depósitos no pré-sal apresentam desafios técnicos e de segurança semelhantes aos que a Nasa enfrentou ao enviar seus primeiros astronautas à Lua? Não. O dinheiro é tentador demais.
O Brasil também esquecerá esse acidente porque vem tendo sorte, já que até agora não ocorreram vazamentos sérios em seus poços marítimos. Mas é quando você se convence de que a probabilidade desse tipo de catástrofe é pequena que elas acontecem. No momento do vazamento nos EUA, a fiscalização federal era frouxa e as precauções de segurança da BP eram insuficientes.
E nem aquele desastre foi grande o bastante para acordar o Brasil. Logo depois do vazamento da BP, o Ministério do Meio Ambiente e a Marinha brasileiros começaram a preparar planos nacionais de contingência para o caso de vazamentos graves, mas eles ficaram incompletos.
Em dezembro de 2010, nova lei regulamentando a E&P da camada pré-sal não adotou normas ambientais e de segurança mais rigorosas em águas ultraprofundas. O foco estava nos royalties.
E, algumas semanas atrás, o Ibama divulgou normas que simplificam o licenciamento de projetos de E&P a profundidades de mais de mil metros e distâncias de mais de 50 km da costa -o que descreve exatamente o local do vazamento da Chevron.
O arrazoado do Ibama: vazamentos de petróleo em águas profundas têm impacto menor do que os que acontecem em campos mais rasos e mais próximos da costa.
Mas diga isso às pessoas das cidades costeiras do Sudeste, que pagarão o maior preço pela cobiça quanto ao pré-sal e agora estão preocupadas com a possibilidade de que o petróleo derramado chegue às suas praias.
“O petróleo é nosso”, o slogan da era Vargas, pode, mais cedo ou mais tarde, se tornar bem mais verdadeiro do que teríamos imaginado.
Michael Kepp, jornalista americano radicado há 28 anos no Brasil, é autor do livro “Tropeços nos Trópicos – Crônicas de um Gringo Brasileiro” (Record).
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