Logo que bati os olhos nessa orquídea, escondidinha no meio de dezenas de Phalaenopsis azuis – é uma epidemia, santodeus! –, já sabia de cara que a levaria pra casa. Mas depois de cinco minutos de conversa com a Érica Shirozu, dona do orquidário que leva seu sobrenome, aí tive certeza de que a planta não só seria minha como ainda renderia um belo texto.
A Caularthon bicornutum tem um nome complicado e esconde um segredo. Orquídea amazônica, gosta de ambientes quentes, úmidos e sombreados, mais ou menos como a floresta de onde vem. Ela dá várias flores de uma só vez, com uns 5 cm de diâmetro, ligeiramente perfumadas, mas, curiosamente, não é em sua floração que está sua graça.
Os pseudobulbos da Caularthon bicornutum são ocos, uma coisa muito incomum em orquídeas. E são assim porque, numa determinada fase de seu ciclo anual, os caulezinhos se racham e ficam cheeeeios de formigas. "Elas devem trazer algum benefício pra planta", disse a Érica, me deixando numa curiosidade inquietante.
Qual seria o benefício de ficar cheia de formigas passeando "dentro" de você? Eu já sabia que as formigas podem ser seres realmente cretinos porque vi muitas vezes a cena de uma cochonilha fiadaputa sugar uma planta e formiga, em vez de comê-la, zanzar de um lado pro outro atrás do cocô açucarado da praga. Logo, pra mim, acabou aquela farsa de formigas boazinhas incutida na infância por A Cigarra e a Formiga. Elas são ordeiras e disciplinadas? Ok, então, zero a zero.
Niqui eu tive a ideia de fazer uma matéria sobre coisas curiosas a respeito das orquídeas. E niqui o editor da Superinteressante gostou e niqui a matéria vai sair, mas com um enfoque bem diferente e não vou nem falar da Caularthon bicornutum, numa dessas maravilhas das sinapses coletivas. A matéria ainda não tem previsão de sair, mas eu conto pra vocês o segredo da orquídea que esconde as formigas: ela lhes dá guarida porque os insetos a protegem do ataque de animais herbívoros. Ou, no melhor estilo co-evolução, os insetos a protegem porque ela lhes dá guarida e ela lhes dá guarida porque os insetos a protegem. Ponto pras formigas – mas elas só enganam a Caularthon bicornutum, não a mim.
Via Superinteressante
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